Defensoria Pública consegue liminar e professora com autismo passará por nova perícia
Giulyane, portadora do transtorno do espectro autista, foi aprovada em todas as fases do concurso público para professora, mas acabou sendo considerada inapta para o cargo.
Na tarde desta quarta-feira (7), a Justiça concedeu decisão liminar parcialmente favorável na ação impetrada pela Defensoria Pública em face do Município de Rondonópolis (218 km de Cuiabá), garantindo que Giulyane Santana, 25 anos, aprovada em primeiro lugar nas vagas destinadas a pessoas com deficiência (PCD) seja submetida a nova perícia médica, no prazo de 30 dias.
Giulyane, portadora do transtorno do espectro autista, foi aprovada em todas as fases do concurso público para professora, mas acabou sendo considerada inapta para o cargo pelo Departamento de Saúde Ocupacional e Perícia Médica (DESOPEM) do Município.
“Se não fosse a Defensoria Pública não sei o que seria. Fui muito bem acolhida quando procurei ajuda e agora vejo que tudo tende a caminhar para um final positivo. A atuação da Defensoria foi de extrema importância porque mesmo eu não entendendo, tem pessoas que estão me ajudando e fazendo com que meus direitos sejam garantidos”, ressalta a professora.
O resultado da avaliação da Prefeitura foi baseado exclusivamente em um trecho do laudo médico encaminhado pela própria candidata, que dispõe que ela “(evita lugares muitos cheios se possível (digo situações de interação social que não agreguem ou que não considerem prazerosas como festas cheias, bailes etc.)”.
DECISÃO – 1002179-58.2024.8.11.0003
Segundo a ação da Defensoria, o laudo emitido pela psiquiatra, utilizado pelo médico perito do Município para declará-la inapta, foi interpretado de forma errônea, fora do contexto, sem considerar a parte mais importante, ou seja, o parecer final.
De acordo com a decisão do juiz Francisco Rogério Barros, a autora exerce a função de professora desde o ano de 2020, mediante contratos temporários com a rede pública de ensino estadual e municipal em Jaciara e Dom Aquino. Ou seja, o ambiente escolar, incluindo os eventos e atividades inerentes à função de Pedagoga, não é uma novidade no cotidiano da autora, tampouco representa um obstáculo para sua atuação profissional, considerando o tempo que já trabalha como Professora.
“Nesse contexto, conclui-se pela presença da probabilidade do direito alegado, a ensejar o deferimento da tutela para que a autora seja submetida a nova perícia médica, pelo Departamento de Saúde Ocupacional e Perícia Médica (DESOPEM) da Prefeitura Municipal de Rondonópolis, bem como para resguardar a vaga dela no certame, até o julgamento da demanda”, diz trecho da decisão.
O defensor público Valdenir Pereira, responsável pelo caso, afirma que a liminar é positiva, uma vez que o juiz, acolheu os argumentos apresentados e, destacou em sua decisão a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência – Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015) e o Estatuto das Pessoas Portadoras de Necessidades Especiais no âmbito do Estado de Mato Grosso – Lei Complementar nº 114, de 25 de novembro de 2002, que dispõe sobre que a compatibilidade entre a deficiência e as tarefas a serem desempenhadas pelo candidato devem ser aferidas por equipe multiprofissional durante o período de estágio probatório.
Getúlio Pedroso, Ouvidor Geral da Defensoria Pública de MT e Coordenador Nacional da Pessoa com Deficiência do Conselho Nacional de Ouvidorias de Defensorias Públicas do Brasil, comemora a decisão. “Celebramos uma decisão parcial com a concessão de tutela provisória, resguardando a vaga da autora para o cargo de Docente da Educação Infantil – PcD, até o deslinde do feito. Esta medida reflete nosso compromisso em assegurar oportunidades iguais para todos, promovendo uma sociedade mais inclusiva e justa”.
O caso – Giulyane foi aprovada em primeiro lugar nas vagas reservadas a pessoas com deficiência (PCD), classificada em todas as etapas do certame, para o cargo de docente da educação infantil em Rondonópolis, com vencimentos de R$ 4.076,85.
Entretanto, a candidata foi impedida de tomar posse no concurso, cuja convocação para lotação e provimento do cargo foi publicada no Diário Oficial do Município nos dias 26, 27 e 28 de janeiro. Diante do resultado, a candidata ingressou com um recurso administrativo no dia 23 de janeiro, julgado improcedente no dia 26 pelo Município, mantendo o parecer do perito.
A candidata tem três graduações, Licenciatura em Ciências da Natureza, Pedagogia e Letras, a última concluída em 2020. Desde então, começou a trabalhar como auxiliar de desenvolvimento infantil (ADI) com deficientes auditivos, e como professora, por meio de contratos temporários. Ela afirma que já passou em outros concursos, como Polícia Militar (PM) e cargos técnicos, mas que tem vocação para o magistério.
Conforme a ação anulatória de ato administrativo, com pedido de tutela de urgência e danos morais, protocolada pelo defensor Valdenir Pereira, que atua por cumulação no Núcleo de Jaciara, houve a violação de diversos princípios jurídicos administrativos, como os princípios da legalidade, eficiência, finalidade e moralidade.
Ante o exposto, a Defensoria solicitou a imediata emissão de atestado de aptidão de sanidade e capacidade física, sob pena de multa diária de mil reais, bem como a garantia da vaga da candidata, conforme a ordem de aprovação no certame. O defensor também pediu a condenação do Município ao pagamento de indenização por danos morais no valor não inferior a R$ 35 mil, além dos salários que a candidata possivelmente vai deixar de receber por não ter sido ainda nomeada.